segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Repostas em tempo incerto

Recebo algumas perguntas (menos do que gostaria) sobre diversos assuntos, mas as perguntas mais frequentes são sobre as pessoas deficientes. Gostaria, se tivesse mais tempo, fazer comentários sobre as minhas respostas(individuais), para que todos (será que existem?) pudessem opinar. Mesmo assim, queria deixar algumas reflexões sobre a deficiência visual, quando comentei tempos atrás o que eu achava sobre o "aproveitar melhor a vida" (aspas minhas).
Conheço muitos cegos e quase todos precisam mostrar ao mundo que são capazes de realizar tarefas cotidianas como qualquer outra pessoa. São provações necessárias e íntimas, como os videntes também precisam mostrar às suas. Pois bem, a diferença maior nestas provações são os reflexos destas ações. Fazemos isso, nós videntes, esperando que o outro (qualquer indivíduo que esteja vendo o que fazemos) seja a nossa platéia. Nosso troféu é a preparação para o próximo prêmio (um ser endomorfo) na esperança de um novo reconhecimento. Aproveitamos os nossos prêmios de uma forma muito "normal", deixamos os sabores da vida para um momento especial: aposentadoria, férias, lua de mel, sexta-feira à noite. Esquecemos do percurso, do que acontece "quando estamos fazendo", olho no olho, um tempinho à mais.
Com os cegos (e outros deficientes) a relação é "hedonista", a entrega é mais temporal, o escutar (até porque isto é uma necessidade vital para os cegos) é mais musical, mais melódico. Ao escutar te reconheço, te desbravo, gozo. Dizem eles (os meus amigos, pelo menos), "já perdi muito na vida, não quero perder mais este momento" A relação do reconhecimento é: me reconheça como um cego bacana e natural, sem firulas". O tempo espera, não sei quando vou te "ver" de novo. Para te "ver", preciso te escutar. Não é bárbaro esta forma de se relacionar com o outro - ESCUTANDO. Silêncio mundo, estamos conversando, preciso parar, desligar o celular, adiar os compromissos (parecido com a propaganda de um tênis) e escutar meu amigo. Tudo está transferido, menos a escuta. Por que nós, viventes e videntes, não fazemos isso? Porque precisamos de mais informações visuais, mais poluição, novos prêmios.
Deixo uma pergunta: qual a diferença entre ver e enxergar?
Para os meus amigos: videntes, cegos e os próximos que virão e para os que já se foram.

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